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O economista e gestor Francisco Vila expõe sua visão sobre o agro brasileiro

5 de agosto de 2022

Aplicando os aprendizados e experiências, tanto de economista como de gestor, costumo analisar os assuntos aplicando o ‘formato drone’ ou, para usar a metáfora do setor, de’ fora para dentro da porteira’
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O economista e gestor Francisco Vila expõe sua visão sobre o agro brasileiro
Francisco Vila – Foto: Divulgação

Interessante observar os métodos utilizados pelo nosso entrevistado, o economista Francisco Stefan Tobisch Vila. Em suas análises sobre diversos aspectos e desdobramentos do agro no Brasil e no mundo, à primeira vista, ele parece se distanciar, como para melhor ‘enxergar’ os pontos a serem discutidos, mas, aos poucos, percebe-se que o envolvimento com cada um dos assuntos é imenso, profundo e bastante motivado por emoções e paixão.

Optei por começar esta entrevista trazendo à tona a origem ‘dessa tal motivação’ para seguir compartilhando os conhecimentos e as inúmeras experiências de Francisco Vila, que tem tanto a contribuir expondo seu Olhar sobre o Agro. Vila dá sua opinião sobre competitividade e o papel do Brasil, fala sobre exportações, sustentabilidade e a comunicação no agronegócio.

Ele é formado em economia e gestão de projetos na Alemanha, seu país de nascimento, e também em administração nos Estados Unidos. Atuou durante 15 anos ministrando cursos de pós-graduação em Portugal e Alemanha. Um dos pontos de destaque de sua carreira se dá como consultor internacional de governos, empresas, bancos e instituições multilaterais em diversos países. É pesquisador de modelos de gestão para empresas em transformação; consultor de sucessão familiar; palestrante; colunista de revistas e programas de TV; conselheiro do COSAG/FIESP – Associação Brasileira do Novilho Precoce – Câmara Setorial da Carne do Min. da Agricultura, Sociedade Rural Brasileira; e assessor de empresas.

Sobre sua linha de atividade Francisco Vila diz que ao aplicar os aprendizados e experiências, tanto de economista como de gestor, costuma analisar os assuntos aplicando o ‘formato drone’ ou, para usar a metáfora do setor, de’ fora para dentro da porteira’. “A necessidade de continuamente incorporar novos aspectos, desde tecnologias disruptivas a conceitos comerciais avançados e, antes de tudo, abordagens inovadoras na gestão de pessoas, obriga a aplicação de análises holísticas dos processos cada vez mais complexos. Dentro dessa ótica, temos que aplicar a análise VUCA do futuro do agro que se apresenta cada vez mais volátil, incerto, amplo e ambíguo. Este é o foco das minhas atividades com consultor, conselheiro e mentor”.

MAB – Como e quando se envolveu com assuntos do agronegócio?

Francisco Vila – Os mais vividos devem lembrar a Crise de Cuba, o momento crítico da guerra fria com receio de outros avanços do regime soviético até na Europa. Foi nessa altura que comprei com amigos uma pequena fazenda na Floresta Negra, fora da eventual rota de uma invasão. Queríamos assegurar a autossuficiência alimentar para 12 pessoas. 20 hectares com horta e produção de aves, suínos e bovinos, o suficiente para três famílias sobreviverem. Porém, quando caiu o Muro de Berlim vendemos a propriedade, ‘pois, nunca mais teríamos uma guerra na Europa’. Ledo engano perante a atual experiência da Ucrânia e as nuvens que se acumulam no Estreito de Taiwan. Quem sabe se não seria a hora de recomprar a fazendinha?

MAB – E no Brasil, de que maneira se integrou ao Agro?

Francisco Vila – Quando cheguei ao Brasil, em 1995, tive a oportunidade de fazer um planejamento estratégico para um conjunto de pecuaristas. Foi nessa altura que descobri o enorme potencial que transformou o Brasil de importador líquido de carne bovina para o maior exportador em apenas 25 anos. Apaixonei-me não apenas pelo boi, mas também pela oportunidade de poder contribuir para a construção de projetos no campo, nas associações e nas políticas públicas atuando em conselhos privados e públicos.

MAB – No quadro atual do Agro no mundo, em quais pontos o Brasil se destaca? Produção, qualidade, mão de obra, tecnologia, extensão territorial… Por quê?

Francisco Vila –Todos estes elementos podemos compactar no conceito 4F (Feed, Food, Fiber e Fuel). Não existe nenhum outro país com dimensão continental e variedade climática que possa produzir em escala alimentos, suprimentos, celulose ou biocombustíveis em quantidade, qualidade e continuidade como o Brasil. O dinamismo dos empresários rurais de um lado e o imenso mercado interno por outro permitem, mas não obrigam a fornecer comida para o mundo. A combinação de recursos naturais e a constante evolução de tecnologias tropicais deixam apenas a questão da mão de obra suficiente e devidamente capacitada como fator limitante para atender as expectativas da FAO de dobrar a produção de alimentos até 2050.

No cenário global, o Brasil precisa ainda investir na conquista da credibilidade, pois na segurança alimentar a garantia dos fornecedores é questão inegociável dos importadores. Um papel proativo na construção de sólidas cadeias produtivas com qualidade, garantia de quantidade e logística eficiente deve ser preocupação tanto do estado como do setor privado.

MAB – Estamos hoje como a 10ª melhor economia mundial. Qual a ligação e a contribuição do agronegócio nacional nessa classificação?

Francisco Vila –A estrutura da balança de exportações ensina o caminho. Independente da vontade de acrescentar valor aos produtos exportados, a vocação do País é o fornecimento de minérios, petróleo e alimentos para o mercado mundial. Nesse contexto, a produção agropecuária é o pilar mais importante por envolver 5 milhões de produtores e assegurar 15 milhões de empregos certos.

Cada grão de soja e milho é uma fábrica de alto teor tecnológico. Isto também vale para outros produtos rurais. Assim, não é necessário, nem comercialmente inteligente, tentar competir com os clientes no aperfeiçoamento das commodities exportadas. Considerando a tendência de desglobalização, do Onshoring e do Friendshoring torna-se essencial entender melhor as preferências dos importadores e procurar contratos de fornecimento de longo prazo. Essa estratégia parece ser o melhor caminho para subir no ranking das economias, pois a demanda por produtos rurais continua crescendo e vai garantir um crescimento sólido do País.

“O agro brasileiro ocupa um lugar privilegiado nas estratégias dos principais fundos internacionais”

MAB – Quais pontos você sinalizaria como preocupantes hoje nas atividades ligadas a Agenda 2030?

Francisco Vila –A interpretação comum do público brasileiro de que a Economia Verde é apenas uma forma escondida de protecionismo comercial não atinge o cerne da questão. Já no século 18, o escritor Jacques Rousseau (em sua obra ‘Retorno da Natureza’) chamou a atenção para uma melhor interação entre os homens e a natureza. Os atuais incêndios em diversos países, resultado da evidente mudança do clima, conscientiza melhor os cidadãos diretamente impactados. Todavia, já que o planeta é um só e que os El Niños e as La Niñas atingem todos os hemisférios, tanto os oceanos, os desertos como as grandes áreas de floresta impactam diretamente nas condições de vida e especialmente na produção rural de todos os países.

Já que o Brasil, pelas invejáveis circunstâncias naturais, é campeão da produção limpa, as políticas públicas devem reconquistar a imagem positiva que foi construída na Eco 92, reunião das Nações Unidas no Rio de Janeiro. Até 2030 temos tempo suficiente para avançar nos projetos em curso e convidar o mundo para contribuir para nossa estratégia de ‘produção com preservação’ canalizando fundos de investimento para o setor produtivo.

Além disso, os problemas cada vez mais evidentes da mudança de clima até no País irão facilitar a tomada de decisão nas políticas públicas e nas empresas (ESG) O que interessa no momento é definir e comunicar o rumo e menos a realização das ações imediatas.

“No cenário global, o Brasil precisa ainda investir na conquista da credibilidade, pois na segurança alimentar a garantia dos fornecedores é questão inegociável dos importadores”

MAB – Como economista, acredita que os investimentos no nosso país serão maiores nos próximos anos?

Francisco Vila – Sim, pois todos os investimentos dependem principalmente de 4 fatores: existência de recursos (oferta), demanda, capital, bem como cenários de riscos aceitáveis. O Brasil pode absorver fundos para recuperar seu pasto e converter mais 20 a 30 milhões de hectares em área de lavoura. No mundo a demanda por alimentos deve crescer em função da combinação do crescimento populacional e do aumento de renda. Capital de investimento existe em excesso e a procura de projetos com oferta e demanda equilibrada está garantida. O risco físico é limitado em função da dimensão do País e o risco de credibilidade pode ser trabalhado com políticas públicas consistentes. Assim, o agro brasileiro ocupa um lugar privilegiado nas estratégias dos principais fundos internacionais. Além disso, a implementação da bioeconomia será uma atração ainda maior em termos de retorno, sustentabilidade e risco.

“Até 2030 temos tempo suficiente para avançar nos projetos em curso e convidar o mundo para contribuir para nossa estratégia de ‘produção com preservação’ canalizando fundos de investimento para o setor produtivo”

MAB – Francisco, como você vê o papel da mídia, neste momento, em relação às reais informações sobre o Agro no Brasil?

Francisco Vila –Opinião é uma e ação é outra coisa. O consumidor global compra o que precisa. Ele procura produtos com preço acessível, com garantia aceitável de saudabilidade e com nível de qualidade certificado. O resto é tema para conversas, mas pouco impacta nas decisões dos 80% da população que compram alimentos. O Brasil não teve, nem terá problemas para assegurar todos os critérios de qualidade ou saudabilidade. Assim, as exportações continuarão crescendo conforme o aumento da renda dos consumidores nos principais países importadores. Além disso, convém lembrar que não é o consumidor que decide sobre a origem dos produtos. Ele compra o que os tradings e grandes importadores colocam em seu supermercado. E os dirigentes dessas empresas possuem conhecimento detalhado sobre todos os aspectos dos países dos quais compram. Eles sabem que o Brasil produz bem, em quantidade e qualidade e precisa exportar para escoar suas safras. O resto é conversa.

Por Mara Iasi/Redação Portal Mundo Agro Brasil

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