Escrever sobre esse tema me leva até as primeiras lembranças da infância. Meu avô materno, seu Pedro Arroyo, foi produtor agro a vida toda na região de São José do Rio Preto.
Eu vivia em São Paulo e a cada período de férias viajava para casa dele e da minha vó, dona Maria. Por esse motivo, convivi bastante com o agronegócio, que na época era chamado de roça, e aprendi a enxergar esse mundo pelas lentes do produtor agro.
Meus avós começavam o dia muito cedo. Eu acordava com o cheiro do almoço sendo preparado e o sol ainda estava nascendo no horizonte. Era dona Maria preparando a marmita, um caldeirãozinho envolvido com pano de prato para manter a tampa fechada e o garfo e faca amarrados, que meu avô iria comer mais tarde.
Enquanto isso meu avô ia recebendo na porta de casa a turma que ia trabalhar no sítio com ele. O que para eles era trabalho, para mim era diversão. Passava o dia acompanhando ele, conversando com todos e aprendendo sobre a paixão que move o agronegócio, o amor do produtor pela lavoura!
As conversas eram leves, os ensinamentos passados através de “causos” contados e as colheitas eram frutos dessa construção em comunidade e trabalho duro.
Aprendi ai sobre oferta e demanda. As safras mais produtivas e vigorosas vinham acompanhadas de preços baixos. Já as safras castigadas por eventos climáticos ou pragas e doenças eram remuneradas com preços recorde.
E nesse sobe e desce cíclico de preços, as contas andavam de lado e sempre ficava algum pelo na cerca, ou seja, sempre ficava uma dívida que era rolada para o outro ano. Mas a esperança é que a próxima safra seria bem melhor. E com essa fé no futuro, o produtor agro seguia avançando.
O tempo passou, me tornei ainda mais agro, me formei em zootecnia e, para alegria do seu Pedro, fui trabalhar na empresa que ele mais admirava na época.
Meu avô se foi, mas minhas raízes do agro já se encontravam bem fixadas e cultivadas para seguir em frente, e durante mais de 20 anos como executivo, todas as minhas conquistas vieram da proximidade junto ao produtor agro.
Hoje tenho a oportunidade de representá-los e defender seus direitos. De lutar por sua representatividade e fazer valer sua voz na busca de melhores resultados. De abrir novos caminhos e liderar na busca de tecnologias, e suportar com treinamentos e capacitações.
Afinal, o produtor agro hoje é um empreendedor brasileiro, é um empresário do agro. E é assim que ele precisa se perceber e se fazer percebido, pois sua vida não é mais plantar e colher somente.
Ele tem hoje demandas muito maiores e desafiadoras, como planejamento, visão financeira e contábil, sustentabilidade, implantação de novas tecnologias, negociação, entre inúmeras outras. Muita coisa mudou e ele vem se adaptando, evoluindo e avançando.
O que menos mudou nesse tempo todo é a questão dos resultados econômicos no campo. O produtor continua esquecido ou até desvalorizado quando os preços são baixos e, crucificado quando são altos.
A quantidade de pelo na cerca também aumentou, pois para toda mudança citada anteriormente, foi necessário investir e captar mais recursos como alavancagem do negócio. Porém, o resultado do seu negócio fica cada vez mais concentrado nas indústrias de beneficiamento ou trades de commodities agrícolas.
O agro pode ser pop, tech, mas jamais será tudo se o produtor não for valorizado ou mesmo deixar de existir. Uma indústria agrícola é só um monte de ferro sem as matérias-primas produzidas no campo.
As trades serão apenas papéis sem valor se não houver produção. Há uma enxurrada de relatórios de sustentabilidade de empresas que valorizam o produtor nas fotos. Mas, poucas têm algum programa de divisão de ganhos em sua cadeia.
Por esse motivo, pretendo, aqui neste espaço, trazer mais sobre o valor do produtor agro e não sobre o preço ou cotação de seus produtos, por dois motivos principais:
- Para que a sociedade conheça melhor e perceba um valor maior nos produtores agro, e os apoie, cobrando melhores condições de negociação das empresas que comercializam e industrializam o que é produzido no campo. O fair trade será necessário e fundamental.
- Para que o próprio produtor relembre seu valor e sinta cada vez mais orgulho de sua atividade produtiva e essencial.
Há muito que evoluir? Sem dúvida. Porém, essa evolução será maior, mais ágil e robusta quanto maior for a valorização vinda do cliente final, do consumidor, da sociedade.
Vamos seguir esse trajeto juntos nas próximas colunas.
VQV!
Por Denis Arroyo
Leia outras notícias no portal Mundo Agro Brasil