Natural?

Quando nossos hábitos distorcem (quase) tudo
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Eu sou de uma época que havia morangos em agosto. Uma celebração à delícia, que coincidia com o meu aniversário. Tínhamos um livro de receitas para utilizarmos frutas e verduras, conforme a estação do ano, o seu ciclo natural de disponibilidade. Há tempos que este livro não é mais editado.

Hoje em dia temos morangos o ano todo, o que foi fundamental para uma ação que a escola de minha filha promoveu ao longo de 2023: um trote, para o qual todos de seu ano tinham que trazer algo comestível, feito em casa, para vender aos demais anos nos intervalos e arrecadar fundos para ações coletivas.

Fizemos espetos de morango com chocolate o ano inteiro – um sucesso! Tivemos que aumentar a produção a cada edição, rever o preço, ao comparar com o posicionamento de produtos “concorrentes”, e pensar como valorizar a embalagem/forma de apresentação.

Uma aula prática de planejamento, compras, marketing, vendas e matemática financeira. De comportamento seguro também, pois tivemos que cortar as pontas dos espetos.

De Economia Circular , ponderando a geração de resíduos em cada modelo de negócio e aproveitando itens e matérias-primas ao máximo.

De relacionamento, pois a ansiedade de todos era imensa, de coleguismo, onde um ajudava e incentivava o outro, de promoção da responsabilidade pelo objetivo comum e de aprendizado contínuo.

Tudo numa simples ação da escola, quanta sabedoria!

Eu aproveitei os momentos ao fogão (aprendendo a derreter o chocolate em Banho Maria…) para dar uma aula de história da imigração japonesa no Brasil, descrever os desafios de produtores rurais, expostos ao clima, à incidência de pragas, à escassez hídrica, e para provocar reflexões pensando Ciclo de Vida :

  • Onde se dá a produção dos ingredientes, onde são beneficiados e como retornam muito mais caros para o Brasil
  • As demandas por rastreabilidade das práticas, ao longo da cadeia
  • A existência de certificações, como Fair Trade, que visa a justa remuneração de quem produz
  • As emissões  decorrentes de todas as etapas do processo, inclusive de transportes, mundo afora
  • A pegada hídrica, incluindo a fase de higienização dos morangos em casa e dos utensílios utilizados
  • Contando “causos”, como as campanhas contra o abacate na Alemanha, ou as implicações da preferência pelo chá orgânico da Argentina
  • Destacando a importância de combatermos o desperdício de alimentos e promovermos a doação de produtos, que estejam em condições adequadas para o consumo

A opção foi possível graças à distorção de termos morangos disponíveis o ano todo. Poderíamos ter variado com uvas, banana, maçã, mas talvez não teria promovido tantos aprendizados, para o bem e para o mal.

Sonia Karin Chapman

Diretora da Chapman Consulting


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